"Monocrômica, anacrônica, atraente, arcaica Antonina, não amo-te ao meio, amo-te à maneira inteira."
Edson Negromonte.



segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

NOSSAS HOMENAGENS AOS 90 ANOS DE BRIZOLA


EU E O GOLPE DE 64
Quando era criança um nome provocava arrepios em minha casa: Leonel Brizola. Passei minha infância acreditando que esse camarada era do mal, uma espécie de Inca Venuziano, um Celacanto que provocava maremoto. Minha tia Nininha passava o dia com o ouvido no rádio, querendo saber os detalhes do referido golpe. Ela amaldiçoava Brizola, dizia que Goulart era um frouxo e que Fidel era um assassino. Pois então, os militares "salvaram" o Brasil dos maus brasileiros e dos que queriam vender nosso país para Fidel. A minha família estava salva, Antonina estava livre das garras afiadas dos bandidos comunistas e eu pude enfim voltar ao campo do "flamenguinho" para jogar futebol.
A imagem daqueles anos difíceis que mais me chamou atenção foi a foto do estudante morto estampada na capa da revista O Cruzeiro. Não sei exatamente com precisão qual foi o meu sentimento, só sei que aquela imagem do menino, um pouco mais velho que eu, com a camisa branca ensangüentada e com os olhos de terror, me chocou. Não foi medo, como se eu estive assistindo ao seriado "Pesadelo", foi pena, tristeza, com um pouco de revolta, tanto que por muito tempo ela me perseguiu.
Anos depois, na Reitoria da UFPR, no ano de 1977, participando de uma manifestação estudantil contra a prisão de alguns membros da UNE, vi a polícia do exército baixar no lago e cercar todas as saídas. A primeira impressão que tive foi o medo de virar aquele estudante morto da capa da revista. Como meu trauma não me salvaria daqueles policiais, tratei de me esconder no Centro Acadêmico Hugo Simas e lá fiquei trêmulo e acovardado. Minutos depois um policial entrou com um cassetete não mão e gritou, me encarando: "Pra fora"! Comigo saíram alguns alunos e um cara mais velho, talvez um professor. De cabeça baixa passamos por um corredor polonês, sem sermos agredidos. Ao chegar à calçada da rua XV, em frente à entrada do Teatro da Reitoria, dei de cara com um policial, cuja fisionomia não me era estranha. Ele me olhou e disse: "O que você está fazendo aqui?". Levei alguns segundos para dizer a ele que estudava no prédio e participava da reunião. Ele me olhou nos olhos, perguntou se estava tudo bem comigo e disse para eu seguir meu caminho. Durante o trajeto da Reitoria até o terminal Guadalupe, fui buscando em minha memória de onde eu conhecia... Antes de entrar no ônibus, de súbito, me lembrei dele. Seu nome era Wilson e foi policial em Antonina, mas o fato inusitado veio em seguida: quando era criança ele me ensinara a nadar, na Prainha.
Os anos seguiram e eu nunca mais vi Wilson. Só sei que ele foi morar em Paranaguá e não sei se ainda está vivo ou morto.
Segui minha trilha, comecei a trabalhar, casei e tive minha primeira filha. Em 1983, com três anos de serviço público, participei da primeira greve. Logicamente a coisa estava mais branda, Figueiredo levava seu governo com a barriga, querendo logo entregar o Brasil a um civil qualquer. A greve não deu em nada, mas muitas vieram – poucas com algum ganho, muitas tendo que pagar os dias faltosos - e hoje quando olho para meu contracheque sinto que ganhei muita experiência... hehehe!
Na campanha presidencial de 89, fui levado por um amigo ao comício do Brizola, no Centro Cívico, onde fui apresentado ao grande Taiguara. Brizola estava distante de mim, mas se tivéssemos trocado algumas palavras, com certeza diria que ele foi uma espécie de Celacanto da minha infância. Taiguara foi gentil, elegante comigo, mas logo se afastou e ficou ao lado do Brizola.
Vi e ouvi Brizola contar sua trajetória política e o sonho que ele tinha para o Brasil. Logicamente fiquei impressionado com seu vigor e me surpreendi aplaudindo aquele senhor de 70 anos que ainda sonhava, que ainda gritava sua indignação pela fraude da Rede Globo em tentar lhe roubar o Governo do Rio de Janeiro.
Não fiquei até o fim do comício, pois minha segunda filha acabara de nascer e eu tinha que dar uma força em casa. Caminhei até o estacionamento e coloquei o adesivo do Brizola no vidro de trás do meu Fiat 147, junto com o do Lula. Como era a minha primeira eleição presidencial, não sabia exatamente em quem voltar – se na esquerda nova ou na antiga – só sei que eu queria vigar aquele estudante morto na capa de O Cruzeiro.
Enfim cheguei defronte ao meu prédio. Olhei para cima e vi a silhueta da minha esposa com minha filha no colo. Deixei o carro na garagem, querendo logo chegar à minha casa e poder abraçá-las. Subi correndo, de dois em dois degraus, ansioso, porém mais leve.  Ao chegar ao corredor escuro do meu andar, ainda ofegante, uma sensação de leveza e paz me arrebatou. Naquele momento a imagem do estudante morto não mais me fustigava, embora quisesse vingá-lo, mas a maior revelação foi a de Brizola que, de Celacanto da minha infância, passou a ser o Nacional Kid da minha maturidade... Mas acabei votando no Lula.

Um comentário:

Anônimo disse...

O 'malandro' engoliu todo mundo...


Não deixe de ver o vídeo que é sensacional e que,duvido, possa ser mantido
por muito tempo.
Jornalista tarimbado, José Nêumanne Pinto lança hoje, no RJ, e no próximo dia 23, em SP, o livro "O Que Sei de Lula". Em entrevista exclusiva concedida aos colunistas José Marcio Mendonça e Francisco Petros, o autor fala da vida do (ex ?) presidente, apresentando picantes fatos que pouca gente tem conhecimento. Para ver, clique aqui.
Ou aqui: http://youtu.be/4Du5e2oNEn0

O JEKITI NOS ANOS 60 - foto do amigo Eduardo Nascimento

O JEKITI NOS ANOS 60 - foto do amigo Eduardo Nascimento