"Monocrômica, anacrônica, atraente, arcaica Antonina, não amo-te ao meio, amo-te à maneira inteira."
Edson Negromonte.



domingo, 27 de março de 2011

OS VALORES CONTRADITÓRIOS DO CARNAVAL DE ANTONINA

Tempos atrás, falando da cultura do nosso povo, escrevi sobre a necessidade de mudar o atual modelo do carnaval de Antonina. Sem dúvida alguma nosso carnaval é reconhecidamente um dos melhores do Paraná, devido ao seu caráter lúdico. Essa ludicidade está diretamente ligada à tradição, cujas características principais são a espontaneidade do povo e a luta da comunidade em manter viva sua cultura carnavalesca. Nossos blocos tradicionais são a essência da nossa cultura, porque muitos deles ainda mantêm as mesmas raízes dos seus fundadores, como no caso do Apinagés e Boi do Norte. Esses dois blocos, em conjunto com as “escandalosas” e outros blocos de sujos que saem na segunda-feira, a meu ver, são os símbolos da nossa cultura carnavalesca. Embora migrada, isto é, trazida de outras regiões por pessoas motivadas pelo desenvolvimento econômico, não a descaracteriza, pois essas pessoas criaram raízes em nossa cidade e muitos dos seus descendentes são os responsáveis em manter a tradição. Outro fator que incentivou nossa manifestação artística foi a passagem das várias companhias de teatro que, a caminho da Argentina, atracaram em nosso porto para apresentações no teatro municipal. Se refletirmos sobre essas referências, concluiremos que nossa cultural carnavalesca está diretamente ligada ao desenvolvimento da cidade, época em que o porto, o Matarazzo e as empresas de exportação alavancavam nossa economia. Esse fator, embora tenha fortalecido o carnaval, desencadeou praticamente o desaparecimento da nossa cultura artística mais genuína: o fandango. As consequências do êxodo rural, a meu ver, foram a razão principal do esquecimento do fandango, pois as gerações seguintes daqueles que mantinham viva essa cultural a substituíram por outra, no caso, pelo carnaval.
Com o aparecimento das rádios e seus programas de auditório, outro fenômeno ganhou força no carnaval de Antonina. Coincidência ou não a mídia de então influenciou diretamente a transformação de muitos blocos em Escolas de Samba, nos anos 40, seguindo o mesmo modelo de desfile dos blocos, isto é, desfilando pelas ruas sem o rigor dos dias atuais. Com o advento da organização dos concursos de escolas de samba carioca, primeiro na Avenida Getúlio Vargas, depois na Sapucaí, as escolas antoninenses aderiram ao mesmo modelo e o povo que era parte integrante da festa passou a ser mero espectador.
Mas a tradição genuína ainda se mantém viva na segunda-feira, dia em que os blocos de sujos e “escandalosas” seguem os mesmos rituais de outrora, dia em que todos se tornam parte integrante da festa. Se analisarmos a fundo essa questão, veremos que alguns personagens, blocos e outras formas de manifestação ainda seguem suas culturas carnavalescas e, queiram ou não, para mim são os verdadeiros representantes do nosso carnaval. Vocês talvez me questionem sobre o sábado, dia em que alguns blocos, como o Apinagés e Boi do Norte, saem, e eu vos digo: Embora esses blocos mantenham o nome e algumas peculiaridades tradicionais, a meu ver, descaracterizaram-se dos seus padrões culturais, tanto nos rituais, como no aspecto estético.
Outro fator que prova a importância do carnaval da segunda-feira é a quantidade de pessoas que comparecem na “avenida”. Sem precisar de um meio sofisticado de aferição, identificamos que em comparação ao sábado e domingo, o público praticamente dobra na segunda-feira e essa razão tem tudo a ver com o interesse que o povo tem de ser peça integrante da festa. Se analisarmos o sucesso do carnaval da Bahia e Recife, o renascimento dos blocos de rua no carnaval do Rio de janeiro, cuja tradição voltou neste ano, na certa nós sentiremos essa relevância, pois, como no caso das festas religiosas, o povo, além de querer ser participante, quer que seu contexto histórico-cultural seja respeitado.
Mas em seu contexto há questões que precisam ser revistas. O espaço, por exemplo, já não comporta o número de pessoas que vão assistir às escolas e muito menos para os tradicionais blocos que saem na segunda-feira. Neste carnaval muitos blocos tiveram que buscar outros lugares, pois a “avenida”, em boa parte, estava tomada pelo concurso das “escandalosas”.
Em relação ao pequeno espaço que se tornou a Carlos Gomes, sei que não estou contando novidades, pois há anos já existe essa discussão para ampliar o espaço do carnaval, inclusive mudá-lo de lugar. Essa questão só será possível se o município tiver capacidade de investimento e isso nós sabemos que Antonina não tem. Outra possibilidade é via orçamento federal ou parceria com a iniciativa privada, sendo a primeira mais viável. A segunda opção é a mais difícil devido à exigência de mercado, isto é, do retorno financeiro sobre o que fora investido.
Como vimos há possibilidades, mas caso não seja possível nenhuma das opções acima, cabe à administração atual rever os critérios de acomodação do público assistente e dos blocos que saem na segunda-feira. Embora saibamos das dificuldades de logística é possível criar espaços adequados para aqueles que desejam assistir ao desfile de domingo de maneira mais confortável. Arquibancadas com ingresso pago e banheiro exclusivo são possibilidades não só de acomodação do turista como também de geração de receita. Outra possibilidade, nesse caso para a segunda-feira, é utilizar outro espaço para o concurso das escandalosas, com o intuito de liberar a “avenida” para os blocos de sujos tradicionais, bem como promover e explorar os outros espaços comerciais. Outra questão a ser revista é a falta de uma programação mais ampla, isto é, utilizar horários alternativos para as manifestações populares. O período da tarde pode ser utilizado por bandas carnavalescas, como acontece no Rio de Janeiro com a Banda de Ipanema. Aposto que essa medida além de ampliar a festa permitirá que o comércio tenha outro meio de arrecadação, bem como dar ao turista mais opção para se divertir.
Provavelmente haja outras saídas e este espaço está aberto para sugestões. Embora saiba que tudo depende de dotação orçamentária, acredito que algumas melhorias podem ser implantadas com poucos recursos. O que não se pode é continuar com esse modelo anacrônico, inflexível e que não oferece conforto ao público, nem condições para as manifestações populares. As alternativas estão aí e acredito outras surgirão, é só uma questão de visão e espírito público daqueles que tem a incumbência de gerir nossa maior festa popular.

Nenhum comentário:

O JEKITI NOS ANOS 60 - foto do amigo Eduardo Nascimento

O JEKITI NOS ANOS 60 - foto do amigo Eduardo Nascimento